A DIRECÇÃO E O
TREINADOR EM CAUSA
Depois de ter sido “despedido” da Liga dos Campeões sem honra
nem glória com uma vergonhosa derrota em Dortmund por 4-0, antecedida de um
jogo deplorável na Luz em que a milagrosa vitória por 1-0 não chega para
escamotear o que realmente se passou, o Benfica perdeu desde a 16.ª jornada do
Campeonato sete (7) pontos, oferecendo de bandeja, como tudo indica, o título
ao Porto numa época em que, mais do que em qualquer outra, importava vencer
para pela primeira vez na sua história somar quatro campeonatos seguidos – ser
tetracampeão.
Se é certo que matematicamente nada está perdido, não há
ninguém que fria e racionalmente acredite que tal objectivo ainda seja possível. Por
uma ou duas razões muito simples: primeiro, porque o Benfica está a jogar
pouco, muito pouco; segundo, porque o Benfica não tem um plantel à altura das
suas ambições e dos desejos dos seus fervorosos adeptos.
Vê-se, muito mais nitidamente nas últimas jornadas, que desde
que a equipa adversária se feche com onze homens atrás da linha da bola que o
Benfica não tem soluções para ultrapassar esse obstáculo. Ainda hoje, em Paços
de Ferreira, essa incapacidade foi confrangedoramente visível. Os defesas
trocam a bola entre si sem progressão e sem que qualquer adversário os
incomode, perdendo o Benfica por jogo nessa farsa de posse de bola inútil cerca
de 20 minutos úteis. Depois a bola chega aos extremos que ou a centram sem nexo
ou não sabem o que fazer com ela. O jogo interior é quase nulo e o que é
tentado através de passes curtos ou um pouco mais longos acabam por cair
invariavelmente nos pés dos adversários.
E tudo isto acontece porquê? Porque o Benfica não tem (deixou
de ter) quem no meio campo seja capaz de romper as linhas adversárias,
nomeadamente quando elas jogam muito juntas. Depois percebe-se que também não
há nenhum trabalho prévio, nenhum treino específico para as bolas paradas.
Sempre que há um livre Pizzi acerca-se da bola, seis, sete ou as vezes que
calhar por jogo, para fazer um passe em arco para a cabeça de quem lá está,
repetindo até ao fim do jogo sem alterar, ou sem que ninguém dê uma ordem de
mudança, jogadas inúteis e inofensivas. O mesmo se diga dos cantos. Pizzi marca
mal e sem nexo os cantos, sempre da mesma maneira, tantos quantos houver, de um
lado e do outro, sem qualquer resultado prático e sem que dentro do campo
chegue uma ordem de mudança.
Pois bem, se nas bolas paradas o jogo interior é uma lástima,
no jogo corrido ainda é mais.
E tudo isto porque o Benfica deixou de ter dois jogadores
fundamentais no meio campo: os tais que poderiam romper as linhas quando as
equipas adversárias se fecham e deixou de ter também quem seja capaz de rematar
a meia distância tanto em bola parada como em bola corrida.
Se muitos destes defeitos, visíveis há várias jornadas, são da
responsabilidade do treinador, que nada faz para os alterar e para tentar dar
outra dinâmica à equipa, outros – a maior parte – são da responsabilidade da
direcção, nomeadamente do presidente Luís Filipe Vieira.
O Benfica fundamentou o despedimento de Jesus na ausência de
aposta na formação. E era sem dúvida um grande e importante fundamento. Jesus
atreito à ideia de que somente queria jogadores feitos ou por ele “formatados”
deixou que grandes talentos saíssem do Benfica sem terem retribuído o muito que
o clube investiu na sua formação.
Dizia-se que, com Rui Vitória, o Benfica iria apostar na
formação e revelar ao mundo da bola as “pérolas” do Seixal, passando o Benfica
a ter a partir de então uma equipa que fosse uma mescla bem combinada de
experiência e formação, deixando assim de gastar milhões e milhões de euros em
jogadores de duvidosa qualidade. Diminuiria a dívida e o seu serviço e aumentariam
as receitas e, pelo efeito combinado de ambas, os lucros.
Acontece que essa famosa aposta na formação não passa de um
grande embuste. De facto, quando se fala em aposta na formação o que toda a
gente pensa é que o plantel principal do Benfica passaria a integrar
criteriosamente jovens vindos do Seixal, capazes de se imporem na equipa
principal e de nela ganharem maturidade para que um dia mais tarde, esses
talentos, a meio da sua carreira, pudessem ser vendidos se o Benfica
necessitasse dessas vendas.
Ora, não foi nada disto o que aconteceu. O que aconteceu foi
algo muito diferente e muito grave. Esses jovens talentos realmente despontaram,
entusiasmaram o mundo do futebol, mas sem que tivessem adquirido um mínimo de
maturidade, seis ou dez meses depois de terem aparecido na equipa principal do
Benfica foram vendidos.
Consequências: a primeira é a direcção do Benfica, mais
concretamente o presidente, estar-se
completamente nas tintas para o que possa acontecer a esses jovens jogadores
nas suas novas equipas; miúdos de 18, 19 ou 20 anos, sem qualquer maturidade,
vêem-se obrigados nas equipas para que foram transferidos a assumir, perante a
nova equipa e os seus adeptos a grande
responsabilidade de terem sido comprador por quantias milionárias; a segunda, é
a de o Benfica como equipa não ter usufruído minimamente dessa formação –
jogadores que poderiam durante mais três ou quatro anos dar o seu contributo à
equipa são vendidos ao fim de meses sem que ninguém os substitua.
Por que é que isto acontece? Por que tem o Benfica
necessidade de comprar Rafa por 18 milhões e vender Gonçalo Guedes por 20?
A resposta é simples: ao Benfica, ou seja, ao presidente e aos
seus empresários, o que interessa é vender e comprar. Porque a vender e a
comprar é que se ganha dinheiro. Mas não é certamente o Benfica que o ganha já
que a sua dívida, apesar de todas as tiradas demagógicas em contrário, não
cessa de aumentar.
A venda de Renato Sanches e a de Gonçalo Guedes, os tais dois
únicos jogadores capazes de em momentos críticos romperem as linhas adversárias,
vai custar o campeonato ao Benfica. Eles foram e ficaram outros que bem
poderiam ter ido por metade ou um terço do preço que, mesmo assim, o negócio
seria, sob todos os pontos de vista, mais bem lucrativo para o Benfica e para
os seus adeptos!