A PASSIVIDADE DAS AUTORIDADES JUDICIAIS
Desde há mais de um ano que o Benfica tem estado diariamente
debaixo de fogo dos seus dois principais rivais, seja directamente por
intermédio dos respectivos presidentes e directores de comunicação, seja
indirectamente por via de comentadores dos respectivos clubes, seja ainda por via
de comentadores ditos independentes, embora com uma agenda totalmente
coincidente com a daqueles quanto aos objectivos a atingir.
Para os rivais e inimigos jurados do Benfica não seria
admissível a hegemonia que o clube da Luz vem tendo no futebol português nestes
últimos anos. Tanto o Porto como o Sporting, por razões não inteiramente
coincidentes, não poderiam admitir a continuação desta hegemonia, tendo-se
desde cedo proposto, em santa aliança, a travar uma guerra sem quartel para a
evitar.
No Porto, uma direcção anquilosada, envelhecida,
intervencionada, que virou as costas à modernidade e ao progresso, só lhe
restava para sobreviver, depois dos múltiplos fracassos registados nos planos
desportivo e financeiro, lançar mão dos velhos métodos para tentar tirar de
cena o “renascido” Benfica. É uma luta pela sobrevivência na continuidade.
No Sporting, depois de um cenário apocalíptico, que somente
por um triz se não concretizou, venceu o populismo, que no desporto, tal como
na política, tende a reagir um pouco como os animais, ou seja, contra o que
está mais próximo, identificando como causas do mal-estar a aparência das
coisas e não as verdadeiras razões do desconforto. No caso do Sporting, houve o
aproveitamento hábil desse sentimento antibenfiquista que cada coração de leão
alberga como refúgio seguro dos seus múltiplos e frustrantes ressabiamentos.
Reciprocidade que está longe de ser partilhada pelos benfiquistas mais
esclarecidos por o Sporting já não ser há muitas décadas o verdadeiro rival do
Benfica! A isto junta-se o facto, não despiciendo, de o homem que dirige o
Sporting viver exclusivamente daquilo que faz no Sporting, não havendo
indicações seguras de que saiba fazer outra coisa. É também uma luta pela
sobrevivência, mas aqui na verdadeira acepção da palavra.
A guerra contra o Benfica começou com as “ofertas aos
árbitros”. Ou seja, algo que era do conhecimento das instâncias oficiais e dos
múltiplos agentes ligados à arbitragem. Eram ofertas feitas no fim dos jogos,
independentemente da actuação de quem as recebia, com o intuito de mera
cortesia. Não há notícia de nenhum árbitro ou qualquer outro elemento das
instâncias da arbitragem as ter recusado.
De que é que o Benfica pode ser acusado? De querer ser
simpático para com os árbitros. Certamente. E condicioná-los? Mais difícil, mas
sempre dependente da personalidade de cada um. Entre isto e as ameaças ou a
criação de um clima público de crispação contra os árbitros e a arbitragem, o
que é mais perigoso? Certamente, este segundo comportamento, aliás proibido
pela UEFA e pela FIFA e também pelas instâncias internas, embora a maior parte
das vezes sem a coragem para extrair desses comportamentos as respectivas
consequências. A verdade é que eles são eficazes, muito em consequência da
impunidade que os acompanha, na medida em que condicionam os árbitros, levando
a que estes na dúvida favoreçam quem os ameaça ou os insulta para não terem de
se deparar diariamente com as consequências dessas ameaças e insultos que os
atingem a eles e aos seus agregados familiares.
O caso dos vouchers, como ficou conhecido, só
foi caso porque uma comunicação social sedenta de “sangue” e de audiências dá
guarida a todo o lixo que lhe chega desde que possa lucrar alguma coisa com
isso. De outro modo, nem como nota de rodapé aquele pretenso caso figuraria na
agenda mediática. Aliás, as instâncias desportivas nacionais e internacionais,
arquivaram o caso, embora posteriormente o MP, que em muitos aspectos está cada
vez mais parecido com os comentadores de futebol bem como com a lógica que os
orienta, tenha “ressuscitado” a questão, seguramente sem qualquer êxito futuro,
mas com o êxito desde já garantido de continuar a alimentar a especulação.
Infelizmente, neste e em muitos outros casos, o MP parece bastar-se com “êxito”
da publicidade das suas próprias actuações com aparente desprezo pelo resultado
final dos processos, que é o que verdadeiramente conta e o que deveria ser a
sua única e exclusiva peocupação.
Escusado será dizer que neste caso o Benfica andou mal, desde
o início. Deveria ter assumido sem reticências tudo o que estava fazendo,
reiterado o propósito de continuar a fazê-lo, recusando-se a participar
directamente ou por intermédio dos que lhe são próximos em discussões ou
debates que tivessem por objecto os “vouchers”.
Depois vem o caso dos emails, que é um dos casos mais graves
ocorridos nestes últimos anos no espaço associativo e empresarial português,
sobre um assunto que por lidar com o futebol acaba por ter uma amplificação
desproporcionada e acrítica, prestando-se a todo o tipo de manipulações e
juízos de intenção, apenas possíveis em domínios onde, sendo a regra a
irracionalidade, o homem mais se assemelha com os animais.
Em duas palavras, o caso consiste no seguinte: o Futebol
Clube do Porto roubou ou tornou-se receptador da correspondência privada do Benfica,
dando dela público, descontextualizado, sincopado, porventura até deturpado,
conhecimento, por intermédio de um funcionário do clube, em sessões semanais,
acompanhadas de comentários tendenciosos baseados em juízos de intenção,
especulações e falsas conclusões caluniosas.
A correspondência de que foi dado público conhecimento era
resultante de conversas informais entre os seus intervenientes nas quais
predominava a coloquialidade própria deste tipo de conversas privadas, abrangendo
tanto a que era emitida por personalidades com ligação ao Benfica como a que
lhes era dirigida por pessoas estranhas ao Benfica.
Os juízos de intenção, formulados pelos ladrões ou
receptadores da correspondência roubada, bem como de muitos que por via destes
a ela tiveram acesso, tinham em vista insinuar que as vitórias do Benfica
assentavam na corrupção (pressupondo-se a corrupção de árbitros ou outros
elementos ligados à arbitragem) ou, mais remotamente, no tráfico de influências,
chegando alguns até ao ponto de afirmar que o Benfica tinha um projecto de “captura”
do futebol português e das suas instâncias dirigentes.
Apesar de não ser fácil de imaginar o que representa ter
acesso a milhares e milhares de emails
roubados, é porém fácil de constatar que nessa gigantesca quantidade de
material privado confidencial, muito dele informal, somente uma escassa meia
dúzia de emails suscitou o interesse
mediático, o que não deixa de ser um dado importantíssimo sobre o funcionamento
interno do clube, e mesmo esses, como já se percebeu, são juridicamente inócuos.
Alguns dos emails
que mais curiosidade suscitaram e, consequentemente, mais se prestaram a juízos
especulativos de toda a ordem, formulados como se de uma autêntica
interpretação se tratasse, não eram da responsabilidade do Benfica nem de pessoas a ele ligadas, mas de pessoas estranhas ao Benfica.
Em nenhum desses emails,
porém, há o mais pequeno vestígio de corrupção, fosse ela com vista à compra de
resultados ou de outro fim, assim como em nenhum deles é possível encontrar
indícios de tráfico de influências.
Apesar de isto ser uma verdade incontornável, já que ninguém
até agora foi capaz de pegar num email
emitido perlo Benfica e com base nele configurar um comportamento ilícito, o
certo é que, durante mais de meio ano, a famosa questão dos emails do Benfica animou centenas de
horas de debates e “notícias” nas televisões, nas rádios e nos jornais,
partindo-se sempre do pressuposto de que havia factos indiscutíveis que apenas
precisavam que sobre eles fosse “soprado o pó” para que, com toda a evidência,
pudessem ser confirmadas à luz do dia aquelas caluniosas conclusões.
Não há em nenhum desses emails
(emitidos pelo Benfica) que o sr. Marques roubou ou receptou nada,
absolutamente nada, que se assemelhe ao que nós ouvimos nas escutas do “Apito
Dourado”. O mais grave, porém, não foi o facto de esses emails se terem prestado às mais variadas especulações e
imputações, o grave foi as autoridades se terem recusado a intervir para pôr
cobro a um furto que estava sendo exibido à luz do dia e usado em proveito do próprio do ladrão. Isto é que foi grave. Como grave foi a essa
passividade se tenha seguido uma actuação das autoridades contra o Benfica, a
partir do material roubado.
Ou seja, as autoridades não só impediram que o furto
continuasse, como partiram dele para iniciar uma investigação de natureza penal
contra o Benfica, o que não pôde deixar de revoltar milhões de benfiquistas que
assim se viram injustiçados, ofendidos na sua honra e orgulho, por autoridades
judiciais que em vez de protegerem o seu clube contra os assaltantes, partiram
do assalto para atacar o próprio Benfica!
Dada a ineficácia da via penal, o Benfica tentou pelos meios
cíveis obter uma decisão que impedisse o Porto de continuar a exibir material
roubado. Esta via cautelar foi inicialmente recusada por um juiz assumidamente
do FCP que, com base numa fundamentação estapafúrdia, concluiu que daquele
comportamento não resultavam prejuízos para o SLB. Meses mais tarde, o Tribunal
da Relação repôs a legalidade violada, impedindo o FCP de continuar a divulgar
correspondência privada, roubada, sob pena de aplicação de uma pesada sanção.
Repôs-se a legalidade, mas o mal já estava feito,
irreversivelmente. Durante este período a direcção do Benfica actuou mal.
Atarantada com o que lhe estava acontecendo, revelou-se incapaz de adoptar uma
estratégia consistente que pudesse neutralizar o efeito do ataque.
Subsequentemente a “essa investigação” que está em curso, as autoridades não se cansaram de lançar achas para a fogueira com factos e comportamentos,
alguns deles absolutamente inverosímeis, como a pretensa suspeita do resultado
do jogo contra o Rio Ave em 2015/2016, o “caso Centeno” (um verdadeiro escândalo nacional) e posteriormente um outro assunto do foro privado de vários intervenientes a
que o Benfica foi maldosamente associado por alguns deles terem neste momento,
ou terem tido no passado ou pretenderem ter no futuro ligações ao Benfica. Como
se esse facto pudesse ser relevante para incriminar o Benfica ou o envolver nessas investigações!
Seguiu-se a famosa questão da “toupeiras”, neste momento na
ordem do dia, que tem a ver com informações prestadas ao Benfica por pessoas ligadas à investigação criminal. Mais uma vez o MP protagonizou um
espectáculo mediático destinado a colher efeitos imediatos de suspeitas por
confirmar em detrimento de uma averiguação serena dos factos. Como alguém já
disse ao MP parece interessar mais o efeito que resulta da publicitação e
acompanhamento das suas acções do que propriamente a punição dos comportamentos
ilícitos pelos meios próprios.
Neste caso das “toupeiras” acusa-se pessoas ligadas ao
Benfica de ter solicitado a funcionários judiciais informações confidenciais sobre
as averiguações que o MP tem (ou parece ter) em curso sobre assuntos em que o
Benfica estaria (?) implicado. E avança-se com a existência de indícios susceptíveis
de configurar o crime de corrupção para a prática de acto ilícito.
Para começar, é preciso que se diga que esta tese do
Ministério Público a que o Juiz de instrução parece ter dado alguma guarida, se
porventura se viesse a confirmar, o que por agora nos parece inviável, não
teria quaisquer consequências desportivas. Tratar-se-ia de um assunto do foro
criminal entre pessoas ligadas ao Benfica ou o próprio Benfica (hipótese que o
MP não pôs até ao momento) e o sistema de justiça português punível nos termos
da lei penal. Esta seria a pior hipótese, todavia os elementos vindos a público
não apontam nesse sentido.
O que os indícios, a serem verdadeiros, revelam é que houve
um ou mais funcionários judiciais que tiveram acesso a processos em segredo de
justiça e, como eram assumidamente benfiquistas, fizeram chegar (não se sabe
como nem por que meios) essas informações ao Benfica ou a pessoas a ele ligadas.
Não existe o menor indício de que o Benfica ou alguém ligado ao Benfica tenha pedido essas informações a troco de uma qualquer indevida vantagem
patrimonial ou não patrimonial ou que os ditos funcionários tenham solicitado
ao Benfica ou a alguém ligado ao Benfica uma recompensa (patrimonial ou não)
para entregar aquelas informações.
E sem que este factualismo esteja provado – e os indícios
vindos a público nem de perto nem de longe deixam perceber a existência desses
comportamentos –, podem dar as voltas que quiserem, mas corrupção é que não existirá!
E não é o facto de essas informações terem chegado ao
conhecimento do Benfica ou de pessoas a ele ligadas que os incrimina do que
quer que seja, qualquer que tenha sido o modo como essas informações foram
obtidas. Portanto, o crime de corrupção, com base nos indícios conhecidos, não
existe!
Perguntar-se-á, então,
por que razão o MP indiciou o funcionário Judicial José Silva? A nossa resposta
é muito directa e clara: por que esse era o único meio de o prender
preventivamente. Qualquer outro crime por que ele pudesse ter sido indiciado
com base nos factos que vieram a público não admitiria a prisão preventiva. E
como em Portugal, infelizmente, se prende para investigar e, de certo modo, até
para punir antecipadamente prevenindo parcialmente a hipótese, sempre presente,
de um desaire processual, não admira que a prisão preventiva seja solicitada a
torto e a direito como se de um procedimento normal se tratasse, quando é
legalmente um procedimento excepcional!. De facto, aos objectivos da
investigação bastaria que José Silva fosse preventivamente suspenso do
exercício das suas funções, da proibição de contacto com outros arguidos e
termo de identidade e residência para que a investigação pudesse prosseguir sem
atropelos nem dificuldades!
Perante este quadro complexo e altamente prejudicial para a
reputação do SLB, a primeira conclusão a tirar é a de que o MP, por razões que
somente ele conhece, tem o Benfica como alvo, na pessoa do seu presidente, Luís
Francisco Vieira. E vai continuar, aproveitando tudo o que pode aproveitar,
mesmo correndo o risco de enveredar por comportamentos inadmissíveis, como
aconteceu com o caso Centeno.
A segunda conclusão, é a de que muito dificilmente este clima
deixará de se reflectir no comportamento desportivo da equipa, que é, no fundo,
o que o FCP e o SCP inequivocamente pretendem.
A terceira conclusão, é a de que tão cedo não vamos ter
respostas concludentes oriundas dos processos em curso, o que significa, por
outras palavras, que o “batuque” vai continuar por tempo indeterminado.
Felizmente, quando estava retirando estas conclusões do que está
a acontecer, o Presidente do SL Benfica teve, pela primeira vez desde que esta “paródia”
começou, uma intervenção à altura da grandeza do clube.
A quarta conclusão, que inevitavelmente tiraríamos se aquela
intervenção não tivesse ocorrido, ficará suspensa e desejamos que para
sempre, o que seria sinal de que o Presidente cumpriu à risca a promessa feita.
Assim esperamos!
1 comentário:
Parabéns e obrigado pelo excelente comentário sobre toda esta comédia "dell'arte" contra o Benfica , do meu ponto de vista, a única que trata de modo bem explícito todos os aspetos desta espinhosa questão . Só um ligeiro reparo : estou de acordo com tudo o que é dito sobre o MP, mas é omitida , quanto a mim, a componente...CLUBITE , nos atos do MP. Mesmo bem disfarçada, a Joana Marques Vidal enverga a camisola do fcp...tal e qual o reles (pseudo)Juíz que permeditadamente não pôs cobro á divulgação pública dos "mails" do Benfica , obtidos de forma criminosa . É pena que este assunto tenha servido para criar clivagens entre Benfiquistas, os eternos obcecados pelo poder ,( não muitos, felizmente...), não hesitaram em relembrar o seu anti-Vieirismo e até aproveitaram para anunciar de maneira clara, as suas ambições...deixando no ar, de maneira nada subtil, que " a culpa disto tudo" tem sido do LFV...Feitios !!!
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