quarta-feira, 11 de maio de 2016

A MALA DE QUE NINGUÉM FALA




POR RAZÕES ÓBVIAS



Quem, não sendo muito dado às coisas do futebol, por estes dias ouvir a comunicação social, radio, imprensa, televisão, fica a saber que há no futebol português um título em disputa, entre dois clubes – o Benfica e o Sporting -, que no próximo domingo se decidirá.

Desde há pelo menos três semanas que esta informação vem sendo massivamente veiculada. Mas não só. Quem não souber mais nada, quem não for informado destas coisas da bola fica a supor que há um clube – o Benfica – que tem de ganhar todos os jogos que lhe faltam jogar para ser campeão, enquanto o outro clube – o Sporting – apenas precisa de esperar por uma derrota ou um empate do Benfica para ser campeão. O que levará essa pessoa pouco informada a deduzir que o Sporting já realizou e ganhou todos os jogos que tinha que jogar. Só lhe restando agora esperar…

Todavia, não é assim que as coisas se passam. O Sporting, tal como o Benfica, também tem de jogar todas as semanas e só poderia ser campeão se ganhasse todos os jogos e o Benfica empatasse ou perdesse algum. Mas, então, se é assim por que é que ninguém fala na hipótese de o Sporting não ganhar ou de empatar um dos jogos que ainda tinha para jogar e somente se falava nos jogos do Benfica?

Agora, que chegamos à última jornada, o Benfica jogará em casa contra o Nacional da Madeira, enquanto o Sporting vai a Braga jogar contra o quarto classificado, exactamente o mesmo clube que há dois meses o eliminou da Taça de Portugal. Pois apesar de o jogo do Benfica ser teoricamente um jogo mais fácil do que o do Sporting todo o mundo dá o do Sporting por antecipadamente ganho e o do Benfica por ganhar, havendo quem veja hipóteses de o perder.

Mas não é apenas na última jornada que isto acontece. Já na jornada em que o Sporting se deslocou ao Dragão, ninguém questionava a vitória do Sporting, questionando-se antes muito dramaticamente a do Benfica sobre o Guimarães.

Acontecerá isto porque o Sporting tem uma equipa tão poderosa e tão superior a todas as restantes que até seria de mau tom admitir outro desfecho que não a vitória, enquanto o Benfica, pobre equipa, tem de lutar pela vida como um náufrago jornada a jornada? Mas se assim fosse o Sporting estaria muito à frente no campeonato, todos os seus índices desde os pontos aos golos seriam inquestionavelmente incomparáveis aos demais. Ora como não é nada disso o que se passa, bem pelo contrário, temos de encontrar outra explicação mais convincente para este modo de apresentar as coisas.

Uma hipótese seria a de o Sporting saber antecipadamente que vai ganhar, com transmissão desse conhecimento à comunicação social, que actua sempre com muita mais racionalidade do que aquilo que em regra se supõe. A favor desta tese poderia invocar-se a mal disfarçada felicidade com que os dirigentes, adeptos e comentadores do Futebol Clube do Porto acolheram a derrota da sua equipa contra o Sporting. E também o facto de tanto o União da Madeira como o Vitória de Setúbal terem jogado contra o Sporting propositadamente desfalcados de mais de meia equipa. Já quanto ao Braga, próximo adversário, ainda é um pouco cedo para tentar perceber o estado de espírito com que se apresentará no domingo, embora a hipotética contratação de Paulo Fonseca como treinador do Sporting, por fuga de Jesus para o Porto, possa ser um índice a ter em conta.

Por outro lado, percebe-se bem por que razão a comunicação social tem posto e continua a pôr tanta ênfase nos jogos a disputar pelo Benfica, qualquer que seja o adversário. Compreende-se a partir da observação do modo como essas equipas jogam contra o Benfica. É natural que a comunicação social analisando e percebendo o imenso estímulo que para essas equipas representa defrontar o Benfica admita permanentemente a hipótese de o Benfica perder ou empatar o próximo jogo, qualquer que seja o valor da equipa em causa. A comunicação social, como todos nós, não pode deixar de observar a garra, a fúria com que essas equipas defrontam o Benfica, uma garra e uma fúria que parecem impulsionadas por uma força exterior. Algo que vindo de fora as impele a ter um comportamento único, um comportamento que nunca tiveram, nem vão voltar a ter contra qualquer outro adversário.

Pelo contrário, as equipas que jogam contra o Sporting fazem o jogo normalmente – às vezes nem isso – não havendo qualquer evidência ou sequer indício de estarem a actuar impulsionadas por uma força exterior. Ora, isto só demostra que nenhuma mola as impele a ter um comportamento diferente. Não há mola, nem mala que as compense.

E no caso dos adversários do Benfica poderá dizer-se o mesmo? Será certamente a partir da resposta a esta questão que se poderá compreender o modo diferenciado como a comunicação social tem feito a antevisão dos jogos do Benfica e do Sporting. A comunicação social nunca se engana, sabe sempre mais do que parece saber e sabe certamente acerca disto muito mais do que nós!

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