O QUE ESTÁ POR ESCLARECER
Já se sabe que o futebol nada tem de democrático. Pelo contrário, é uma das actividades onde persistem mais arreigadamente as práticas anti-democráticas ou, ainda pior do que isso, uma cultura anti-democrática.
Os exemplos são tantos e tão eloquentes que nem vale a pena a gente deter-se neles. Em Portugal, temos o caso do FCP, que vive há longos anos em ditadura; temos o comportamento de Mourinho que só sabe treinar desde que reúna em si todo o poder; e temos também o caso do Benfica que de clube mais democrático de Portugal passou a ser, desde que Vieira lá chegou, um clube exactamente igual aos outros. Pela primeira vez, houve com Vieira eleições sem candidato opositor, por terem sido criadas toda a espécie de dificuldades a quem se queria apresentar. E mesmo nas últimas eleições, em que formalmente houve oposição, o clima que rodeou a apresentação da candidatura opositora e a própria campanha eleitoral foi de tal ordem que bem se pode dizer que ele em nada diferia do que em circunstâncias análogas é criado pelos regimes políticos ditatoriais quando, para salvar as aparências, se vêem obrigados a deixar concorrer um oponente…cuja sorte está traçada desde o começo.
Num clima desta natureza não admira por isso que os treinadores – entidades em quem em última instância repousa a sorte financeira das instituições que servem – tenham frequentemente um comportamento arrogante e anti-democrático quer para os adeptos, quer inclusive para os próprios jogadores. Não se sentem minimamente obrigados a dar explicações dos actos que praticam, nomeadamente se estão a ganhar, e são terrivelmente impertinentes perante qualquer pergunta que um jornalista mais ousado resolva fazer para tentar compreender certas situações.
Vem tudo isto a propósito da não inclusão de Capdevila na lista remetida à UEFA para a Liga dos Campeões. Há aqui qualquer coisa que se não percebe. E a primeira pergunta que qualquer pessoa começa por fazer será esta: por que razão não serve para o Benfica, sequer como segunda opção, aquele que até à última época era o defesa esquerdo da selecção de Espanha, campeã da Europa e do Mundo? Como se compreende que o treinador tenha para aquele efeito “repescado” César Peixoto que esse mesmo treinador tinha colocado a treinar à parte e que só permaneceu no Benfica por não ter encontrado até 31 de Agosto um clube que o aceitasse?
Não está em causa o mérito e o valor de Emerson, embora se não trate de um grande jogador. É um jogador “certinho” que desempenha o seu papel sem exuberância, em princípio, sem erros. Mas apenas em princípio, porque como ainda no último jogo contra o Nacional se verificou, Emerson, à medida que o encontro se aproximava do fim com o resultado tangencial de 1-0 e a pressão aumentava, cometeu vários erros, alguns graves, aparentemente atribuíveis ao desconhecimento do que é jogar num grande clube.
E se Emerson tiver um azar é César Peixoto que o vai substituir? Mas mesmo que tudo se situe no domínio das famigeradas “opções técnicas” como justificar então a contratação de Capdevila, um jogador veterano de quem não se pode esperar que “progrida no banco”?
É isto que o treinador do Benfica ou alguém com responsabilidades no clube tem de explicar aos adeptos.
No entanto, não deixa de ser sintomático que idêntica má vontade exista por parte do treinador relativamente a Nolito, um jovem, também de nacionalidade espanhola. Pois não seria normal que, depois de um começo auspicioso ao serviço do Benfica, Nolito fosse acarinhado pelo treinador, como tem sido pelos adeptos, quanto mais não fosse como reconhecimento de uma rápida adaptação, situação que para tantos outros, inclusive consagrados, tem sido tão difícil de alcançar?
Também aqui não está em causa o valor de Bruno César que aliás, por direitas contas, nem sequer seria um verdadeiro concorrente de Nolito. O que está em causa é o estranho comportamento de Jesus, sempre a desmerecer do jogador.
Perante este quadro, prejudicial aos interesses do Benfica – e em que poucos falam por a equipa estar a ganhar -, fica-se com a dúvida, conhecidas que são as limitações e arrogância de Jesus, se ele não se sentirá menos à vontade com jogadores oriundos de países altamente desenvolvidos, países onde a sociedade civil tem um desenvolvimento em muitos outros domínios para além do futebol que está longe ter paralelo noutras paragens.
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