terça-feira, 18 de janeiro de 2011

O SPORTING DEU-SE MAL COM A DEMOCRACIA


DE CRISE EM CRISE

O Sporting navega de crise em crise há muitos, muitos anos. Primeiramente, esteve dezoito anos sem ganhar o campeonato e agora já lá vão quase dez desde a última vitória.
A partir da grande transformação operada no futebol, entendido como um grande negócio, e quando, simultaneamente, se esbateu o papel dos “mecenas” que antes todas as equipas buscavam, o Sporting deixou de ter meios para competir em igualdade de circunstâncias contra os seus principais rivais.
Em princípio, nada justificaria que o Sporting tivesse menos meios do que o Porto, porque sendo então um clube com maior projecção nacional do que o Porto e beneficiando de uma escola de formação de jogadores indiscutivelmente superior, além de também ter, à época, um passado desportivo, em várias modalidades, mais rico do que o seu rival nortenho, tudo apontaria no sentido de o Sporting poder congregar os meios necessários para se manter de facto (isto é, com vitórias) e não em teoria como um dos maiores clubes portugueses.
Tal não aconteceu. O Sporting sofreu, como muitos outros clubes de menor dimensão, as consequências da sua inadaptação à nova situação.
O Sporting era – e ainda é, nos aspectos que contam – aquilo a que se poderia chamar um clube "aristocrático". As “boas famílias” de Lisboa eram e são do Sporting, o Sporting esteve sempre ligado a extractos da alta/média burguesia e era dirigido por uma espécie de “governo aristocrático” onde o povo só entrava para desempenhar o mesmo tipo de funções (metaforicamente falando) que os hoplitas desempenhavam na Grécia antiga: a guerra, ou seja, em linguagem futebolística, para prestar no campo apoio à equipa!
Foi assim que o Sporting foi concebido e foi assim que o Sporting funcionou na maior parte da sua história. Contrariamente ao Benfica que sempre foi um clube popular, ligado à arraia-miúda, apoiado por tudo quanto é suburbano à volta de Lisboa e com apoio esmagador no resto do país, o Benfica, em consonância com a sua origem, sempre foi, pelo menos até Vieira, um clube democrático, dirigido pelo voto popular. Um clube onde sempre houve confronto de opiniões expresso na apresentação de listas divergentes. Sempre, tanto durante a ditadura salazarista, como depois, até Vieira.
Já no Porto as coisas se passavam de forma diferente. Prevalecendo-se do facto de se tratar do maior clube da segunda maior cidade do país, com pretensões a assumir-se como clube regional (o que ainda hoje, não obstante os progressos, está longe de ser uma evidência), o FCP sempre viveu muito “encostado” à cidade que o viu nascer e tudo nele era tratado numa perspectiva bairrista. Um bairrismo clássico, não violento, nem excludente, que cantava as virtudes dos seus sem hostilizar os de fora.
Com a chegada na década de oitenta de Pinto da Costa ao poder, depois de uma luta fratricida pela sua conquista, o FCP assumiu-se como uma verdadeira ditadura, com palavras de ordem hostis e violentas contra quem era de fora e a criação de um clima de permanente crispação no futebol português que já nada tinha a ver com as antigas e saudáveis rivalidades clubistas. Mesmo dentro do próprio clube reina para todos a mais férrea disciplina, não se admitindo dissidências nem oposições. O único candidato que até agora ousou desafiar em eleições o poder de Pinto da Costa foi ferozmente hostilizado, apodado de louco e só não foi internado num hospital psiquiátrico porque a tanto não chegava o poder do presidente do Porto.
Esta estratégia, porém, aliada a outros tantos factos inconfessáveis, resultou e causou danos incalculáveis nos dois grandes clubes de Lisboa. Mais, muito mais, no Sporting do que no Benfica. O Benfica levou algum tempo a perceber o que se estava a passar, mas acabou por perceber. Estribado numa falsa ou verdadeira amizade que utilizava perversamente, o presidente do Porto conseguiu neutralizar a oposição do Benfica durante a fase inicial de ascensão e consolidação do seu poder. O Benfica acabou por reagir depois, desorientou-se frequentemente quando começou a constatar que já tinha perdido influência e protagonismo, mas, como nunca perdeu adeptos nem apoio popular, conseguiu manter-se na luta.
O Sporting não percebendo o que se estava a passar e vendo sempre no Benfica o seu principal rival, nunca, salvo episodicamente, se opôs com firmeza à crescente hegemonia portista, com a qual frequentemente se aliou para proveito e gáudio de Pinto da Costa.
Por outro lado, continuando a ser governado “aristocraticamente”, mesmo depois da extinção do conselho dos quinhentos, o Sporting não estava preparado para lidar com as demandas provenientes da base. Esta, desde sempre habituada a obedecer, foi aceitando durante muito tempo sem grandes protestos os presidentes que lhe apresentavam para dirigir o clube. Ainda houve um começo de revolta há muitos anos atrás com Gonçalves, saído directamente do povo, e depois com Cintra, tão povo quanto o primeiro, embora aureolado de self made man formado na “cultura do compra por 5 e vende por 50”, que os posteriores desenvolvimentos do 25 de Abril amplamente facilitavam.
Como, porém, os resultados foram péssimos, no primeiro caso, e maus, no segundo, rapidamente se voltou à cooptação dos presidentes dentro do círculo restrito aristocrático dominante.
Primeiro foi Santana Lopes pela mão de Roquete, depois o próprio Roquete enfado com os desmandos empresariais de Santana Lopes, a seguir Dias da Cunha e depois Soares Franco. Depois da chegada de Pinto da Costa ao poder, este foi apesar de tudo o melhor período do Sporting: ganhou dois campeonatos, Taças de Portugal, Supertaças e vários segundos lugares.
Todavia, como houve uma cisão no grupo dirigente durante o mandato do último presidente cooptado (Soares Franco) entre facção deste e a de Dias da Cunha, não foi possível, por pressão de bases cada vez mais exigentes, manter o sistema da cooptação seguida de ratificação.
E o presidente seguinte teve mesmo de ir a votos. Ganhou José Eduardo Bettencourt por larguíssima margem. Apesar de legitimado eleitoralmente pelo voto dos sócios, Bettencourt, empossado como presidente profissional, não resistiu à pressão das bases. Não soube impor-se; não souber dirigir; não soube contratar; enfim, era difícil encontrar alguém que num tão curto espaço de tempo fizesse tantas asneiras.
Primeiro foi a demissão de Paulo Bento, o treinador que melhor serviu o Sporting nas últimas décadas; depois a revolta do balneário ou de parte dele contra Sá Pinto, director desportivo, e a sua substituição por Costinha, um homem sem qualquer ligação ao clube, onde nunca conseguiu impor-se nem criar qualquer tipo de empatia com os adeptos nem com os media; antes disso o tratamento desprimoroso para com Carvalhal, um homem inteligente que, tendo ficado com a equipa em condições difíceis, deixou o Sporting na UEFA, onde aliás fez com ele uma excelente temporada; a seguir o anúncio da substituição de Carvalhal, com a época a decorrer, pelo treinador do Vitória de Guimarães, clube onde, aliás, tinha chegado já no decurso dessa mesma época ido do Paços de Ferreira; depois, a venda de Moutinho ao Porto num negócio que os sócios não compreenderam; finalmente, a contratação de Couceiro para superintender em Costinha e no treinador.
Restou-lhe a demissão na pior fase da época, deixando o clube à deriva.
EM TEMPO:
Os sportinguistas são impagáveis. Nicolau Santos, subdirector do Expresso, tão liberal em economia e em política caseira, desde as leis do trabalho ao comércio internacional, é proteccionista em matéria de futebol! Grande coerência.
A Federação ou a Liga, diz ele, deveriam impor aos clubes a inclusão de um número mínimo de jogadores portugueses nas equipas. Porquê? É fácil responder, porque o Sporting não tem dinheiro para competir com o Benfica nem com o Porto.
E por que não limitar as exportações da Alemanha à obrigatoriedade de aquisição de uma determinada percentagem de produtos portugueses? E...e.. por aí fora. Não há nada como o futebol, a paixão clubista, para os ver mandar a coerência às malvas!

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