A PROPÓSITO DOS
PENALTIES E DE OUTRAS OPÇÕES
O futebol dá-se muito mal com a crítica. Pelo menos, em
Portugal é assim. É verdade que poucas pessoas gostarão de ser criticadas qualquer
que seja o ramo de actividade a que se dediquem sempre que a crítica ponha em
causa o que por elas foi feito. Se a crítica é elogiosa a situação muda por completo. De
rejeitada a crítica passa a ser citada. Alguns outros estabelecem uma distinção
entre crítica construtiva ou destrutiva. A primeira teria em vista ajudar a
fazer melhor e seria ditada pela única preocupação de aferir o objecto da
crítica com o paradigma perfilhado pelo crítico. Já a destrutiva teria como
única finalidade dizer mal, pôr em causa o que está sendo feito pelos outros e
seria ditada pela baixa formação moral do crítico.
É claro que tudo isto não passa de conversa. A crítica é uma
actividade fundamental e imprescindível em qualquer sociedade democrática,
tendo apenas – e este apenas é tudo – a sua validade que aferir-se pelo seu
valor intrínseco. Não é necessário que crítico e criticado perfilhem os mesmos
valores ou que o crítico saiba fazer o que ao criticado critica. O que é
imprescindível é que a crítica seja técnica e valorativamente sustentável.
E o que se passa numa sociedade como a nossa é que, apesar de
os criticados em regra não gostarem da crítica, vêem-se na maior parte das
vezes obrigados a tê-la em conta e a responder-lhe. Passa-se assim antes de
mais na política. Raramente na política os criticados concordarão com a crítica
que fazem às suas opções, mas isso não significa que não saiam a terreiro a
defender as suas posições. Passa-se assim também nas actividades profissionais
mais ou menos especializadas. O criticado responde à crítica e defende o seu
ponto de vista. Igualmente assim se procede nas artes. O artista, apesar de não
gostar nada da crítica que ponha em causa a sua obra ou alguns aspectos dela,
não pode fazer de conta que a crítica não existe e, embora contrariado, vê-se
obrigado a responder-lhe. Até em questões da vida pessoal todos nós nos vemos
obrigados a responder à crítica quando ela vem de pessoas com quem estamos
estreitamente relacionados.
Mas há em Portugal uma excepção a tudo isto. É o futebol. No
futebol, principalmente a crítica feita aos técnicos, nunca tem resposta. O
conteúdo da crítica nunca tem. E se em vez de uma equipa de clube se tratar
da selecção, então as coisas ainda agravam-se mais. A resposta, quando existe,
nunca está relacionada com aquilo que se disse mas com o facto de se ter dito
aquilo. A resposta nunca incide sobre o conteúdo da crítica mas sobre a própria
crítica. E sempre com insinuações e adjectivações estúpidas.
O técnico de futebol é alguém que está acima de toda a
crítica. A sua imensa sabedoria só encontra paralelo na sua incomensurável
arrogância.
Basta ver o que se passou recentemente com Paulo Bento para
não haver qualquer espécie de dúvida sobre a arrogância com que na selecção as
críticas foram tidas em conta. Já antes se tinha passado assim com Queiroz e o
mesmo se passa nos clubes, por exemplo, com Jesus ou com José Mourinho, o mais
arrogante de todos. E todavia – voltando à selecção – Paulo Bento tem muito que
explicar. Explicar, a propósito os penalties,
por que pôs Ronaldo a marcar o último, opção criticada por toda a imprensa
internacional, por que incluiu Moutinho na lista dos marcadores, sabendo, como
não poderia deixar de saber, o historial de Moutinho nessa matéria? Por que
utilizou tão pouco Varela, apesar das boas provas que deu sempre que foi
chamado, quando se estava a ver pela repetição dos jogos que de Nani nunca iria
sair nada de excepcional? Por que convocou Hugo Viana e Ruben Michaelis se
nunca os pôs a jogar, para mais alinhando eles na zona de maior desgaste da
equipa portuguesa? Por que não convocou jogadores com características mais
parecidas com as dos três médios titulares se era esse o modelo de jogo em que
ele acreditava? Por que deixou nos dois primeiros jogos – contra a Alemanha e a
Dinamarca – que o corredor esquerdo da defesa portuguesa ficasse apenas
entregue a Coentrão quando logo se percebeu que Ronaldo não marcava?
Seria interessante ouvir Paulo Bento sobre estas questões e
outras certamente pertinentes para avaliar da consistência das suas opções. Seria
muito mais interessante do que ouvi-lo mais uma vez a criticar a crítica, pelo
simples facto de ter sido feita, esgrimido agora, como muito provavelmente fará,
com a prestação global da equipa, género: “Chegamos com muito mérito às
meias-finais e só fomos eliminados pelo campeão do mundo nas grandes
penalidades”!
Sem comentários:
Enviar um comentário